terça-feira, fevereiro 11, 2014

Paulo Cunha e Silva


Desde 1990 venho a desenvolver na Fundação de Serralves, um pouco sistematicamente, em torno das grandes questões do pensamento contemporâneo mas em que há sempre um pensamento artístico por trás.
Uma exposição é sobretudo um problema, e é sobretudo a vontade primeira de o enunciar e depois de o tentar resolver, não fechá-lo mas até complexifica-lo e dar-lhe outras oportunidades que o problema antes de ser formulado não tinha. Não parto para uma exposição com uma lista de artistas para enfiar num lugar, parto com a mente aberta. Naturalmente que tudo é muito contingente porque há afinidades, proximidades, que de certa forma condicionam a curadoria. Não há uma curadoria branca, genérica, pura, é sempre uma curadoria feita de gostos e de conhecimentos e de afinidades com artistas com quem se convive e trabalha, e portanto essa descontaminação nunca é possível.
Os artistas que têm mais sucesso em Portugal, pelo menos aparentemente, não tem galerias em Portugal, como é o caso de Joana Vasconcelos ou de Pedro Cabrita Reis. O Julião Sarmento tem um galerista português, a Cristina Guerra e depois tem galerias internacionais.
A figura de galerista é um pouco bizarra, muitas vezes porque o colecionador privado tenta sempre esquivar-se a pagar uma percentagem substancial do valor da obra, 30% a 40%, e procura comprar diretamente ao artista. A relação entre o artista e o galerista é muito complicada, é uma relação quase conjugal, e como tal a dimensão da traição está implícita. A história entre galeristas e artistas portugueses é feita desses pequenas traições.
A competição é cada vez maior, os artistas ficam desesperados para obter um galerista, os galeristas promovem os artistas mas quando estes ganham alguma notoriedade saltam para outro galerista que os projete de uma forma mais eficaz e portanto essas relações são relações de interesse.
Devido à crise estamos a assistir à constituição de uma espécie de sindicatos de artistas, associações de artistas que se tentam proteger dessas figuras malévolas de alguns galeristas, que neste caso ainda vão sugar mais o sangue pobre dos artistas.
Das conversas que eu tenho tido com galeristas importantes, o mercado nacional está completamente parado, e internacional condicionado em relação aos artistas portugueses.
O papel da crítica de arte tem-se esbatido um pouco e tem sido ocupado pela figura do curador, o artista sente-se mais próximo do curador do que do crítico, porque o curador é aquele que lhe pode colocar as obras nas exposições, e o curador é também um crítico, também tem um discurso sobre as obras.
Verificamos situações de grande promiscuidade entre a crítica e situações mais pessoais e privadas dos críticos que deviam ter alguma pureza, alguma assepsia. A independência da crítica é uma coisa que está muito posta em causa.
Eu penso que no futuro haverá duas vertentes a do curador-crítico e a do curador-produtor.
O Instituto das Artes resulta da fusão do Instituto das Artes Performativas e do Instituto de Arte Contemporânea, não havia concursos, tocava-se à campainha e as pessoas que eram amigas dos responsáveis tinham mais facilidade em fazer as suas exposições ou entrarem na agenda dos responsáveis do que as outras que não eram. Quando eu fui presidente do Instituto das Artes passei a instituir os apoios à programação às artes em 2003 e 2005.
A internacionalização está muito associada à marca de cada país, e Portugal é um país que tem uma marca muito débil, e portanto a capacidade de o país arrastar os seus artistas está muito condicionada, muito condenada, não há estratégias sistemáticas
Joana Vasconcelos é uma artista popular, criou uma grande empatia com o público, ou seja, ela criou um curto-circuito entre o público e as suas obras que não é criado pelo sistema, não há críticos, não há curadores, não há galerias, criou uma relação direta. Porque criou um mecanismo de dessubjetivação muito rápido, as suas obras são um pouco intersubjetivas, e são obras de empatia imediata, empatia fácil.

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