Herdeiro da Antiguidade
clássica, pela excecional importância deste período na história da arte, as
suas obras constituem um modelo de perfeição estética da Renascença até aos
nossos dias. São impostos os princípios de harmonia, de equilíbrio das
proporções, de simetria, de justa medida. O processo de estetização já não se separa
do projeto de purificação das formas, da aspiração a uma beleza idealizada e
equilibrada, sinónimo de elegância e de graça. A arte não imita a natureza, ela
deve sublimá-la, transfigurá-la exprimindo a beleza ideal, a perfeição
harmoniosa que é a do próprio cosmos.
O humanismo da Renascença
reabilita e reivindica expressamente, no fim da Idade Média surge um segundo
momento que se estende até ao séc. XVIII. Constitui as premissas da modernidade
estética com o aparecimento do estatuto de artista separado do de artesão, com
a ideia do poder criativo de o artista-génio assinar as suas obras, com a
unificação das artes particulares no conceito unitário de arte no seu sentido
moderno, aplicando-se a todas as belas-artes, com obras destinadas a agradar a
um público afortunado e instruído e já não simplesmente a comunicar os
ensinamentos religiosos e a responder às exigências dos dignatários da Igreja.
A dimensão propriamente estética da arte ganha relevo, o artista deve
esforçar-se por eliminar todas as imperfeições e procurar imagens que estejam
de acordo com o que há de mais belo, de mais harmonioso na natureza. Com a
emancipação progressiva dos artistas relativamente às corporações, estes vão
beneficiar, através dos seus contratos com os patrocinadores, de uma margem de
iniciativa desconhecida até então: a aventura da autonomização do domínio
artístico e estético está em marcha.
Este momento secular é contemporâneo da vida
de corte, do aparecimento da moda e dos seus jogos de elegância, dos tratados
de “boas maneiras”, mas também de uma arquitetura que oferece a própria imagem
do refinamento e da graça, de urbanismo de inspiração estética, de jardins que
parecem quadros com esplanadas, esculturas, lagos, fontes, vastas perspetivas,
destinados a encantar e a maravilhar o olhar. Não só apenas a commoditas, mas a graça das formas
harmoniosas, o prazer estético, a venustas
(Alberti), em cidades agradáveis, belas, “de aparência aprazível e de agradável
estadia” (Francesco di Giorgio Martini). Os artistas são solicitados e
convidados para as cortes europeias para criar cenários magníficos, ornamentar
o interior de castelos e a planificação de parques. As igrejas, querendo
seduzir e atrair os fieis, oferecem, com o período barroco, um espetáculo
teatral exuberante com fachadas sobrecarregadas de esculturas, estruturas que
desaparecem sob as ornamentações, efeitos de ótica, jogos de sombra e luz,
baldaquinos, tabernáculos, púlpitos, custódias, cálices, cibórios
abundantemente decorados: é exibida toda uma arte exuberante para criar um
espetáculo grandioso, valorizar a beleza da decoração e esplendor dos
ornamentos. Os monarcas, os príncipes, as classes aristocráticas lançam-se em
grandes que se destinam a tornar as suas cidades e as suas residências mais
admiráveis, mandam edificar castelos marcados pela elegância de estilo,
constroem palácios, hotéis, villas sumptuosas,
enquadrados por parques imensos cheios de estátuas e confiados aos melhores
arquitetos. Remodelam cidades segundo um ponto de vista estético, criando
praças compostas por edifícios alinhados de fachadas harmoniosas, ruas que
oferecem grandes efeitos de perspetivas o embelezamento das cidades tornou-se
um objetivo político de grande importância. Impõe-se uma “arte urbana”, uma
encenação teatral da cidade e da natureza, enobrecendo o ambiente habitado e
aumentando o prestígio, a magnificência, a glória de reis e príncipes.
A partir da Renascença, a
arte, a beleza, os valores estéticos adquiriram um valor, uma dignidade, uma
importância social novos, o que é testemunhado pelo planeamento urbano, pelas
arquiteturas, jardins, mobiliário, obras de cristal e faiança, pelo nu em
pintura e escultura, pelos ideais da harmonia e proporção. Gosto pela arte e
vontade de estilização do enquadramento da vida que funciona como um meio de
autoafirmação social, maneira de fazer marcar o estatuto e ampliar o prestígio
dos mais poderosos. A estetização
aristocrática, durante todo este ciclo, o intenso processo de estetização (elegância,
refinamento, graça das formas) em vigor nas altas esferas da sociedade não é
impulsionada por lógicas sociais, estratégias políticas da teatralização do
poder, o imperativo aristocrático de representação social e o primado das
competições pelo estatuto e pelo prestígio constitutivo da sociedade holística em que a importância da relação dos homens vence a da relação dos homens com as
coisas.
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