segunda-feira, janeiro 27, 2014

Cristina Guerra


Cristina Guerra trabalha com arte contemporânea desde 1983-84. Abriu a Galeria Cristina Guerra em 2001, sozinha. Antes trabalhava com a Filomena Soares, de 97 a 99. E antes disso fiz o Centro Cultural que deu origem ao Centro Cultural de Cascais. Neste momento tenho artistas a sair para fora a fazerem museus. Quando começaram a trabalhar comigo as obras custavam 500€ e agora custam 20.000€. Mas demora muitíssimo tempo, são 10 anos. As galerias têm a cotação real dos artistas, o preço real de um artista está nas galerias. Para mim o sistema triangular da galeria, do crítico / curador e do colecionador continua a ser válido e essencial. Um curador teoriza a obra que o artista faz e portanto há uma melhor compreensão da obra por parte do colecionador.
Em 97 é que se começou, porque as pessoas só queriam telas e começaram a comprar papeis. Hoje em dia o papel pode ser tão caro como uma tela, interessa-lhes a obra em si.
Os colecionadores Americanos, Ingleses e um pouco os Franceses se gostam de uma obra compram. Os Suíços e Alemães querem saber o que é que o artista fez, estudam a obra e só depois é que compram
A partir de 2004 já toda a gente está na internet e é mais fácil saber o que os artistas estão a fazer.
Cristina Guerra refere que hoje em dia temos um problema, não há um museu com uma exposição permanente de artistas portugueses, só há exposições temporárias e vê-se muito pouco artistas portugueses. Há muitos colecionadores estrangeiros que me perguntam onde podem ver arte portuguesa e eu tenho de os levar às outras galerias. No Museu Reina Sofia há um andar que se vê só arte espanhola. Hoje em dia não se vê os artistas de meia carreira ou se vê os mais velhos ou os muitos novos. O que acontecia era que os diretores dos museus primavam mais pelas coisas estrangeiras do que pelas portuguesas, eu acho que deve ser o meio-termo, que é para se perceber, se contextualizar. O Museu de Serralves está à quatro anos para comprar. Eu costumo dizer que “agora somos um centro cultural”. Há muita gente que vem ver mas não compra. Passos Coelho foi a Serralves a primeira vez na vida à pouco tempo. Isto é incrível, não é? O atual secretário de estado é uma pessoa que percebe, pelo menos que conhece de tudo. Mas o tipo que está a dirigir o Instituto das Artes não percebe absolutamente nada. O Mário Soares, o António Guterres e o Durão Barroso eram pessoas cultas, interessadas que visitavam as galerias.
Cristina Guerra refere que, em 2007, a estratégia da galeria com vista a uma maior visibilidade internacional dos nossos artistas no mercado internacional passou por colocar alguns artistas com quem trabalhava e que tinha exibido para coleções internacionais em leilões da Christie’s e da Philips: “o que acontecia é que tinha de colocar uma obra em leilão e depois teria que ser eu, através de outras pessoas, que as comprava.” Como não temos mercado muitos colecionadores vêm os catálogos das leiloeiras, sobretudo internacionais. Há muita gente, mesmo em Portugal, que estuda arte, mesmo algumas galerias, através das leiloeiras, para verem a evolução da subida do preço do artista.
Cristina Guerra considera que está a haver uma evolução do colecionismo privado em Portugal no sentido de uma maior responsabilidade social e cultural. O interesse deste novo colecionismo é que a arte portuguesa se internacionalize e por isso oferecem obras de artistas portugueses para algumas instituições estrangeiras: “neste momento à colecionadores que compram agora obras, para estarem na Tate. Em que não vai buscar em mecenato nem nada. É uma coisa que é pratica corrente em quase todos os países, inclusivamente o Brasil, e que em Portugal não existe.”    
Cita várias coleções de referência, como a recente coleção da Fundação Miguel Rios, a coleção Elypse está fechada, tem poucos artistas portugueses, é muito mainstream, há uma outra coleção, mas compra poucos portugueses, ele é brasileiro, mas a ideia é mais América do Sul e Médio Oriente que é a do Luís Augusto Teixeira de Freitas, a coleção Cachola é a única exclusivamente de artistas portugueses, sendo um privado que não é banqueiro, nem empresário, é um assalariado, consegue fazer uma coleção que toda agente respeita, e algumas coleções institucionais, a coleção BES Arte, a EDP, e outras que fizeram coleções mas já deixaram de comprar há muito tempo, casos da PT e da Culturgest. “Eu não consigo perceber a falta de interesse dos meios institucionais, ou governamentais, ou estatais, por esta área da arte contemporânea. Porque economicamente são bens transacionáveis. Como é que não há mais apoio, nas aquisições fazer alguma coisa pela cultura, já que o turismo cultural existe e está cada vez mais implantado.”
O que acontece é que normalmente vem uma crise e os colecionadores desaparecem todos e voltam a aparecer outros, estamos sempre num recomeço.
Cristina Guerra refere que tem 70m quadrados em Basileia, e custa-lhe toda a operação 90.000 €, o que é um disparate. A maioria dos artistas que expõe são portugueses, custa mais ou menos 10.000€. Menos o desconto de menos de metade, que é o que ela ganha, normalmente tem prejuízo. A não ser que venda um artista estrangeiro, são peças de 80.000€, 90.000€, 100.000€, 200.000€. Olhando para o lado financeiro e económico eu já devia ter desistido à muito tempo. As galerias portuguesas normalmente vão às feiras de arte da: ARCO, Art Basel, Art Basel Miami, Art Forum Berlim, FIAC, Vienna Art Fair, Art Rio e Xangai. Eu entrei em Miami em 2002 e em 2003. Os colecionadores vão todos às mesmas feiras. Os nossos governantes se forem à ARCO já é muito bom, mas alguns nem isso fazem. Quando eu estava na APGA com Pedro Cera, o Estado apoiava para 2 feiras internacionais com um stand mínimo. No primeiro ano, isto à quatro anos atrás, houve 200.000€, agora já foi reduzido para 100.000€. Aparece umas ajudas fugazes como esta da Joana Vasconcelos, que eu acho completamente idiota.

terça-feira, janeiro 21, 2014

Pedro Oliveira


Pedro Oliveira refere que embrionariamente o mercado da arte começa nos anos 80, em Portugal. A partir de 79-80, quando a situação política começa a acalmar, começam a abrir algumas galerias, timidamente. Foi aí que apareceu a Roma e Pavia por intermédio do meu irmão. Depois em 85 tomei conta da galeria. No início servi-me de alguns amigos, especialmente de Jaime Isidoro, comecei com os artistas da minha geração. Fazia um bocado de mercado / dealing: ia fazendo exposições, pouco a pouco, em tendências novas, mas como tinha que ganhar dinheiro fazia mercado paralelo, por intermédio de amigos, que me arranjavam obras mais caras, como era o caso de Jaime Isidoro. A partir de 90 isto começou a crescer, a explodir e apareceram muitos críticos de arte. A partir daí resolvi mudar de instalações e atirar-me para uma coisa maior, e vim para aqui. Na altura era a maior galeria de Portugal, e comecei a avançar para o mercado internacional e a fazer programação mais internacional. Aventurei-me daqui para fora, a arranjar contactos. Esse foi o meu período de ouro, essa década de 1990 a 2000. Ganhei bastante dinheiro, as coisas correram-me muito bem, trouxe cá nomes de artistas muito interessantes da arte internacional. Apesar de tudo ainda mantive um certo ritmo interessante, até meados de 2000. Foi altura da entrada dos artistas Brasileiros, foi a descoberta do mercado brasileiro. Agora tem 25 artistas e se fizer 6 exposições por ano eles têm de esperar 3 anos, para dar a volta.

Pedro Oliveira é defensor de que as galerias devem estar em rede e não se importa de partilhar colecionadores com outras galerias.

Pedro Oliveira considera que poderia ser interessante haver casas de leilões especializadas em arte contemporânea em Portugal, como a Christie’s ou a Sotheby’s, e que esse facto não iria afetar as galerias: “poderia não afetar tanto se houvesse um historial de casas de leilões boas a nível de arte contemporânea em Portugal, o que nunca houve.”

Pedro Oliveira considera que os leilões em Portugal são uma misturada: é antiguidades com pratas, com arte contemporânea pelo meio. A arte contemporânea até aparece nos leilões mas coisas desgarradas. E tudo o que aparece tem um preço muito baixo, o que é muito mau. A única leiloeira que estava disposta a arriscar em fazer um ou dois leilões de arte contemporânea em Portugal, foi a S. Domingos, no Porto, fizeram-me essa proposta para eu a apresentar à APGA (Associação Portuguesa de Galerias de Arte), só que a APGA não quis arriscar.

Pedro Oliveira refere que havia muito dinheiro no Porto nos anos 80, havia muitos colecionadores, sobretudo na cintura industrial industria têxtil e calçado. Tive também muitos contactos de Espanha, especialmente galegos que vinham aqui ao Porto. A partir de 2000 o Porto entrou em declínio, Lisboa começou a crescer e começaram a aparecer as grandes coleções em Lisboa. As sedes das grandes empresas, algumas começaram a fazer coleções bem estruturadas, profissionais, com advisers, como a Culturgest, a EDP e os Bancos (BES Photo), mas sobretudo de particulares como a sociedade de advogados PLMJ, o Saragga Leal que já era colecionador conseguiu convencer os sócios da PMLJ a formar uma coleção corporativa, e focalizaram-se em gente muito nova, foram ajudados pelo Manuel Amado, que é um crítico de arte e que na altura foi o adviser deles. Não há um artista que comece a ficar famoso que eles não comprem. Começaram também a abrir muitas galerias em Lisboa. Apesar de estar no Porto, vendia muito para Lisboa expunha alguns artistas meus em Lisboa por intermédio de algumas galerias ou instituições, de 2001 a 2008. Depois veio a falência do Banco Lehman Brother e estragou tudo!

Pedro Oliveira refere que as feiras de arte são importantes. Para divulgar, para mostrar e para criar contactos. Cheguei a vender tudo o que tinha, a esvaziar o stand, na Art Basel Suíça, que é o Rolls Royce das feiras de arte. Só que neste momento os portugueses não têm dinheiro para fazer feiras de arte. Não há apoios por parte do Estado e as galerias têm como objetivo prioritário, dado o momento atual da crise, a sobrevivência. Se eu estiver a vender uma peça portuguesa no estrangeiro, estou a exportar uma mercadoria com uma conotação especial ligada à cultura, que é uma embaixada importante, é uma mais-valia para o nível da imagem do país.

quinta-feira, janeiro 16, 2014

Colecionadores de Arte Moderna e Contemporânea

Luís Castelo Lopes refere que o conceito de investimento em arte começa em 1973 ou 74 em que o fundo de pensões do caminho-de-ferro inglês tinha dinheiro que era uma coisa absurda e acharam que havia hipóteses de ser rentabilizado alguma daquele dinheiro. E então agarraram em 0,4% do seu fundo, que foram nessa altura 40 Milhões de Libras, e entregaram a um comité presidido por um sujeito da Sotheby’s. E começaram a vender 10 anos depois, em 83 e venderam até 89. Dos 40 milhões iniciais, eles fizeram 280 milhões. E havia num sei quantos curadores que aconselhavam.

O facto de haver várias coleções feitas sem critério desde meados dos anos 80 para cá, em Portugal, foram compradas por aconselhamento às vezes não muito bom. Estas coleções foram feitas em geral num curto espaço de tempo, de cinco a dez anos. Uma outra realidade, refere, é a coleção feita ao longo de vários décadas, vinte, trinta anos, pensadas, e geralmente melhor sucedidas em termos de investimento. Pela sua experiência também ligada ao mercado de antiguidades, as coleções de família, de gerações, que englobam, para além da pintura, o mobiliário, as pratas, as porcelanas, são uma tradição de um determinado tipo de colecionismo em Portugal que desapareceu.

Relativamente ao colecionismo de arte Fernando Santos aponta a escassez de colecionadores: não há muitos colecionadores. “Há poucas coleções a que se possa chamar coleção.” E salienta como boas coleções a de Ilídio Pinho, com cerca de 700 obras, lamentando o facto de este projeto ter parado. A coleção Berardo também é mencionada como sendo uma boa coleção.

Jaime Isidoro, em 2004, sobre o colecionismo em Portugal afirmava “não há ou há pouco. Há duas grandes coleções de artes portuguesa, que é a minha, com cerca de 500 peças, feita ao longo de 50 anos, e a do Manuel Brito, fui eu que iniciei Jorge de Brito. A coleção Berardo não é de arte portuguesa, a arte portuguesa está mal representada.

Manuel de Brito refere em 2005 a escassez de colecionadores “não há muito. Há o grupo de advogados o Saragga Leal”.

Pedro Alvim refere também esta tradição de colecionismo de arte clássica e de antiguidades como sendo uma realidade ao longo de todo o Estado Novo.

Para Peter Meerker o reflexo da crise económica no mercado da arte em Portugal, já de si estreito, a situação é dramática. “Nós vamos às galerias e não há vendas, o mercado é estreitíssimo.” O papel do colecionador é muito importante porque as suas coleções estão depositadas em museus, se analisamos a história e virmos as grandes obras de arte em todo o mundo, na sua génese elas começaram por ser adquiridas por um colecionador.
 
Joe Berardo refere que a aquisição inicial das obras foi feita pelo Francisco Capelo, aproveitando uma conjuntura favorável de baixa de preços em finais dos anos 80. A arte portuguesa, em 2003, estava representada com cerca de 40 obras num total de cerca de 660.
Hargreaves, Manuela – Colecionismo e Mercado de Arte em Portugal, O Território e o Mapa. Porto: Edições Afrontamento, 2013.

quarta-feira, janeiro 15, 2014

Leiloeiras de Arte Moderna e Contemporânea

À medida que este mercado de arte se começou a valorizar e a ser aliciante, várias leiloeiras surgiram em Portugal e se associaram a esta vertente de interesse pelo mercado da arte contemporânea, principalmente a partir de 2000.

Os leilões constituem um marco de referência essencialmente económico sobre o estado do mercado da arte. Dado o seu caráter público, aberto e publicitado, servem de guia para aferir a cotação do artista.

 Essencialmente vocacionadas para a comercialização de arte, antiga ou moderna, as casas leiloeiras têm vindo a assegurar a sua entrada na arte contemporânea nestes últimos anos.

A leiloeira Palácio do Correio Velho foi criada em 1990. Atualmente para além do Palácio do Correio Velho e da Cabral e Moncada, de Lisboa, a World Legend (Leiria & Nascimento), a S. Domingos e a Marques dos Santos, no Porto, são algumas das que operam neste mercado.

Pedro Alvim refere que em 1996, quando a Cabral Moncada Leilões foi criada, era uma empresa muito residual. Eu vim para cá em 99 e era uma empresa como no início, muito pequena. De facto a arte moderna e contemporânea era completamente residual. O primeiro leilão de arte moderna e contemporânea foi realizado em 2007 e a partir daí fazem um leilão anual só para o mercado de arte moderna e contemporânea. As leiloeiras que tradicionalmente existiam no mercado português até 2000-2002 dedicavam-se todas elas ao mercado de antiguidades.

Fernando Santos considera que atualmente as leiloeiras e as galerias colidem mais, há muita oferta, há quem venda apreços baixos por necessidade, mas há quem utilize as leiloeiras para “jogos de estratégia”. Construíram-se alguns artistas assim, mas isso acontece mais no mercado internacional.

Hargreaves, Manuela – Colecionismo e Mercado de Arte em Portugal, O Território e o Mapa. Porto: Edições Afrontamento, 2013.

terça-feira, janeiro 14, 2014

Museus de Arte Moderna e Contemporânea


Manuel de Brito refere que os anos 50 foram um período de pobreza franciscana que estava ligado à política, primeiro os diretores dos museus eram académicos, reacionários, tínhamos um presidente de conselho que não sabia nada de arte e depositava confiança num indivíduo chamado Eduardo Malta, que era diretor do que é hoje o Museu do Chiado, era o Museu de Arte Contemporânea. Ali não entrava ninguém que não fosse académico como ele era. Ganhar a vida com arte só por encomenda, sobretudo escultores, e as encomendas eram do Estado Novo, através de António Ferro, era um individuo sensível e responsável pela propaganda.

O Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian foi inaugurado em 1983. “Era no tempo em que a obra de arte moderna quase não tinha aceitação em Portugal”.

Joe Berardo refere em relação aos museus que a aferição dos artistas nem sempre é a mais acertada e está sujeita ao gosto do diretor do museu que está a exercer o cargo no momento.

Julião Sarmento destaca a falta de um museu de arte contemporânea em Portugal, e o facto de esse papel ser preenchido por instituições privadas como a Gulbenkian ou Serralves. “Não há museus; Portugal é o único país europeu que não tem um museu de arte contemporânea do Estado. O Museu do Chiado é um museu do séc. XIX, é do tamanho de uma caixa de uma casca de noz.”

Fernando Santos refere que Serralves está a perder poder, neste momento. Teve um diretor muito importante, o João Fernandes. Cansou-se, porque as coisas não funcionavam bem e não havendo verbas para programação as pessoas acabam por desmotivar e cansar-se.

Hargreaves, Manuela – Colecionismo e Mercado de Arte em Portugal, O Território e o Mapa. Porto: Edições Afrontamento, 2013.

segunda-feira, janeiro 13, 2014

Galerias de Arte Moderna e Contemporânea


A escassez do mercado galerístico em Portugal, a primeira galeria surgiu em 1954, de Jaime Isidoro (pintor) com a Galeria Alvarez, no Porto, embora tivesse estado fechada vários anos, e em 1964 a Galeria 111 de Manuel de Brito, em Lisboa.
Conforme refere Jaime Isidoro “Não houve mercado, as exposições faziam-se, colocavam-se os quadros e retiravam-se sem se venderem”, Manuel de Brito refere o mesmo panorama desertificado do nosso mercado artístico “Nessa altura era impensável alguém ter um projeto de galeria comercial”. Manuel de Brito considera que o período de maior crise foi o que se seguiu ao 25 de Abril de 1974, porque praticamente fecharam quase todas as galerias.
Manuel de Brito refere que as duas primeiras exposições que fez de Paula Rego não venderam um único quadro. Começa a ter uma convivência mais direta com artistas plásticos numa livraria universitária que tinha ao lado da Faculdade de Ciências de Lisboa, num espaço de 3x4 metros, depois foram vagando estabelecimentos e eu fui adquirindo esses espaços. Nunca me passou pela cabeça ser colecionador, tinha alguns amigos que me davam algumas coisas, mas coisas que eles não atribuíam grande valor, nem eu, porque não havia os números a sobrecarregar a ideia que aquilo era um valor. E não sei porquê os artistas foram aparecendo: “porque é que não fazes aqui uma galerazinha? Tinhas os teus amigos e tal”, “mas isso não me dá nada e o meu sócio ex-patrão dizia: mas isso dá alguma coisa da arte?”, “Não dá nada” mas eu gosto de fazer coisas que nem todos têm à partida um interesse materialista.”
José Augusto França chama a atenção para o facto de o “Clube dos Cem” – exclusivo grupo de cem membros, apaixonados por colecionar arte que contribuem com cem escudos para um fundo comum, que seria aplicado na compra de obras de artistas portugueses vivos, mediante um sorteio – movimentavam verbas superiores às do Museu Nacional de Arte Contemporânea. Embora a atividade tenha cessado em 1968, após dois anos de existência do clube, Manuel Brito, tesoureiro durante o tempo de atividade desse núcleo, viria a canalizar alguns desses contactos para a sua carteira de clientes, em franco crescimento. 
Manuel de Brito refere que inicialmente pediu a um amigo, a um escultor que o ajudasse a confirmar as suas escolhas, mas durou um ano. Nessa altura não havia críticos de arte, o amadorismo, as amizades, também havia pequenos grupos, o grupo de José Augusto França e o grupo da Galeria de Março que acabou. 

Relativamente à evolução do panorama galerístico, nos anos 70 regista-se a inauguração de galerias, tendo vivido toda a primeira fase da sua existência um período de forte agitação política e social e de quase inexistência de mercado de arte, conforme é referido por Alexandre Melo.
Os galeristas Fernando Santos e Pedro Oliveira, do Porto, e Cristina Guerra, de Lisboa, surgem na cena artística 20 anos depois, abrangendo os efervescentes 80, e anos seguintes.
Fenando Santos refere que o nosso mercado é pequeno, com proeminência de Lisboa, onde está situada a maior parte das instituições, tornando-se assim difícil a gestão de uma galeria em Lisboa e no Porto. Iniciou a sua atividade de galerista nos anos 80, a convite da Galeria Nasoni, no Porto, com um projeto que veio trazer alguma dinâmica ao mercado da arte. A Nasoni surge numa altura próspera, estava bem posicionada, tinha boas relações com os meios de negócios. Tornou-se uma referência do mercado da arte em Portuga. Neste momento o mercado da arte cresceu: Há cada vez mais artistas e com mais visibilidade. Há mais galerias. Há mais feiras de arte. Há mais coleções privadas. A internet e as redes sociais, que há 30 anos não existiam, vieram revolucionar de uma forma drástica a difusão da informação e da comunicação. O mercado português abriu-se ao mundo.
Julião Sarmento salienta que hoje o que interessa para a internacionalização é o poder das grandes galerias, dos grandes colecionadores, dos consultores de arte, e dos curadores internacionais, afastando assim a hipótese de qualquer galeria portuguesa conseguir colocar um artista português no topo dessa internacionalização porque Portugal não tem poder para isso.
Hargreaves, Manuela – Colecionismo e Mercado de Arte em Portugal, O Território e o Mapa. Porto: Edições Afrontamento, 2013.

sábado, janeiro 11, 2014

Manuela Hargreaves - Colecionismo e Mercado de Arte em Portugal


 
Hargreaves, Manuela – Colecionismo e Mercado de Arte em Portugal, O Território e o Mapa. Porto: Edições Afrontamento, 2013.

Manuela Hargreaves traça neste livro o panorama da arte moderna e contemporânea em Portugal. O pequeno mundo da arte portuguesa onde são quase inexistentes os estudos de fôlego dedicados ao colecionismo, ao mercado e, em geral, àquilo que poderíamos chamar as condições materiais da circulação e da receção dos objetos artísticos.

Um número enorme de artistas fizeram o corpo do que se pode chamar uma arte portuguesa, isto é, uma arte que acompanha, em diálogo fecundo, as grandes questões que se levantam à arte no plano internacional, sem todavia ter que se fazer fora de Portugal, ao longo do séc. XX, e a começar com Amadeo, o facto é que, nos planos cultural, económico e simbólico, o país não soube acompanhar esse imenso acontecer.

No plano cultural, desde logo, ao ver o seu primeiro museu de arte contemporânea, a recém-criada Fundação de Serralves, abrir as suas portas quando o séc. XX havia já terminado. Nenhuma instituição pública, portanto, já que solitariamente coube à Gulbenkian, fundação privada, colmatar em parte essa falha. Não haverá muitos outros exemplos de tal inanidade na Europa civilizada.

Também a critica, assim como a história da arte, em Portugal, foram instituições mancas e lentas a acompanhar o essencial do trabalho dos artistas, só na segunda metade do século se começou a assistir a um esforço mais sistemático de levantamento e de atenção crítica à contemporaneidade da produção artística, já que na primeira metade do século, a reflexão sobre a arte foi escassíssima e as mais das vezes ficou entregue à mera descrição jornalística. Foi preciso esperar pelos anos 70 do séc. XX para aparecer uma primeira síntese do séc. XX devida a José Augusto França. Os jornais dedicam cada vez menos espaço à divulgação dessa atividade, tendo desaparecido as poucas revistas de arte que brevemente existiram. Neste sentido a imprensa falhou.

No plano económico, o séc. XX foi igualmente um deserto. Apesar de terem surgido alguns colecionadores, Augusto Abreu e Jorge de Brito, falhou em Portugal a construção sustentada de um mercado da arte sólido, capaz de dar consistência à circulação e venda das obras de arte e tudo ficou confinado à atividade pioneira e histórica de duas galerias, a Alvarez de Jaime Isidoro e a 111 de Manuel de Brito, já que todas as demais não passaram de experiência tímidas e temporárias.

A maior parte dos artistas portugueses, por muito interessante que seja o seu trabalho ficou confinada à estreiteza medíocre de um cultura que descrê de si mesma e cujos responsáveis são essencialmente incultos.

A atividade artística relevante passava quase toda pela Sociedade Nacional de Belas Artes (S.N.B.A.), nas décadas de 60-70.