sexta-feira, dezembro 19, 2014

Os artistas, as suas obras e a necessidade de risco

Nuno Crespo, ípsilon o melhor de 2014

Em 2014, houve uma insistência na exposição antológica e uma deslocação da atenção nas obras para a atenção no artista.

Indiscutivelmente e a muitos níveis este ano será marcado pelo fim do BES e por todas as consequências desse fim. Nas artes visuais a falência do banco trouxe o fim do Avenida 211, um espaço de ateliers e de exposições com enorme qualidade, diversidade e onde se puderam assistir a exposições notáveis que dificilmente encontrariam outro contexto para serem desenvolvidos.

O que predomina é a crise e neste cenário a pergunta que mais recorrentemente todos fazem é: até quando? E esta não é só uma pergunta pela recuperação da saúde e dinamismo do mercado da arte, mas essencialmente uma pergunta por um outro contexto institucional em que obras, autores e público se possam relacionar de um modo mais livre, diverso e arriscado. E uma das expressões desta ausência de risco está na inexistência de exposições coletivas, de investigação, em que a atenção monográfica sobre os autores dá lugar à construção de um pensamento com e a partir de obras de arte singulares.

Há as exceções conhecidas em que outras geografias da arte e do mundo são trazidas a debate, mas na sua generalidade assiste-se a uma deslocação da atenção nas obras para a atenção no artista e a uma insistência na exposição antológica, na afirmação da autoridade de um autor, na confirmação de um percurso.

Não se trata de minorar autores individuais e o papel fundamental que alguns deles têm ao conseguirem, através das suas obras, iluminar todo um tempo e uma geração em conjunto com as suas aflições e transformações, mas trata-se de constatar o domínio de uma tipologia expositiva e daí retirar consequências. Esta é uma situação para a qual todos contribuem — os jornais e a sua ideia de informação, a crítica, as direções dos museus e centros de arte e o predomínio das análises estatísticas, a sua obsessão pelo público como principal critério de gestão cultural e programação, etc. — e em que predomina o preconceito do sucesso: os espaços expositivos são hoje lugares dos casos de sucesso de onde estão ausentes a experimentação, a investigação, os projetos exploratórios e o risco a eles associados.

A primeira consequência desta transformação é que as exposições são hoje, sobretudo, reflexo das dinâmicas do mercado e não expressão da singularidade das propostas artísticas, nem tão-pouco materializam linhas de pensamento sobre a realidade, a qual se questiona, investiga e se tenta alterar. Muitas vezes e motivado pelo forte constrangimento financeiro, é o mercado que possibilita exposições, são os seus agentes que através de generosos patrocínios possibilitam e viabilizam exposições, pagam catálogos, oferecem obras a troco da promoção e valorização do conjunto certo de artistas. E as exposições que requerem mais investigação, mais tempo, maiores riscos são secundarizadas e esquecidas. Trata-se do predomínio do artista bem-sucedido (sendo que os critérios de sucesso são muitos e variados) e da ausência de exposições que pensem a nossa condição presente, isto é, exposições que sem caução e sem as garantias da história da arte, dos seus acontecimentos consagrados e longe dos seus protagonistas principais arrisquem pensar os paradoxos do quotidiano.


Num importante texto Alison Gingeras, conhecida historiadora de arte americana, dizia numa importante revista de arte, a ArtForum, sobre um artista: não interessa pensar sobre as suas obras, elas são imunes a tudo o que sobre elas se disser, porque o seu autor através da mitologia que sobre si forjou e do sucesso obtido, conseguiu tornar as suas obras indiferentes a qualquer disputa e, com isso, garantir no olimpo da história um lugar de destaque para toda a sua obra. O texto de Gingeras é sobre Jeff Koons, mas ele serve aqui como ilustração e sintoma da deslocação da atenção que temos vindo a descrever em que os autores colocam à sua sombra o seu trabalho e, assim, o eclipsam.

quinta-feira, dezembro 11, 2014

Martha Rosler

Martha Rosler, tinha 20 anos quando o século XX entrou na década de 1960. Assistiu à transição entre o que restava do mundo moderno e o novo mundo contemporâneo. Mudança após mudança. “Se queremos algum tipo de revolução, temos que fazer manifestações, estar lá fora, organizarmo-nos, dedicarmo-nos.” E isto nem sequer é ativismo. É “cidadania”, disse ao PÚBLICO numa entrevista à margem do Fórum do Futuro, no Porto, onde foi conferencista convidada.

Começou a sua conferência por explicar que, nos anos 1940, quando Jackson Pollock estava a fazer as suas pinturas abstratas, nem os artistas nem os públicos da arte poderiam imaginar a ligação intrínseca entre o seu mundo e os grandes fluxos financeiros internacionais.

A forma como Pollock trabalhava as telas, no chão, tinha qualquer coisa a ver com a ideia de território e posse territorial. Na verdade, o facto de ele desistir da perspetiva – que foi o que fez com a sua pintura – liga-se com a história da posse de terra. Há isso e o mais óbvio: a relação com o dinheiro, que se intensificou muito, porque se tornou muito mais visível. Pollock fez parte da primeira geração de artistas em que os mercados financeiros mundiais se tinham focado nos Estados Unidos e se tinham tornado completamente hipertróficos. Tudo isso e a emergência da cultura de celebridades pesou muito sobre os expressionistas abstratos, a maior parte dos quais faziam parte de uma cultura de boémia outsider vagamente empobrecida.

Acho que podemos dizer que o expressionismo abstrato foi destruído pela sua relação com o dinheiro e a fama. Diria ainda que há uma razão para o modelo de transcendência que ele propunha não poder legitimamente manter-se no mundo do pós-guerra: a economia. Portanto, sabemos mais [sobre a relação entre arte e dinheiro] e a pressão intensificou-se vastamente. Toda a gente que tem hoje alguma relação com o mundo da arte, mesmo ao nível mais popular, percebe a ligação deste mundo ao mundo das finanças, especialmente nos Estados Unidos. Como alguém dizia, chegámos a um momento em que alguns dos artistas são tão ou mais ricos quanto os seus colecionadores. Não é exatamente assim porque alguns dos patronos da arte são incomensuravelmente ricos, mas, obviamente, há artistas que se tornaram extremamente ricos. A ‘financialização’ da arte disparou até para o topo da cobertura [mediática] que se faz do mundo da arte. Em publicações [de referência] como o New York Times os leilões são tão história quanto [as exposições]… É como os desportos profissionais – aquilo de que ouvimos realmente falar é dinheiro, quem custou quanto, quem está a fazer quanto, qual dos grandes jogadores conseguiu o melhor contrato e quantos milhões de euros ou dólares por ano faz.

O mundo da arte tornou-se numa espécie de grande sprint anual, os cem metros barreiras para ver quem chega ao fim melhor cotado no mercado. É uma quantificação e ‘financialização’ de qualquer coisa que antes considerávamos estar fora do sistema de avaliação das mercadorias [cujo valor depende das leis da oferta e da procura] e que agora sabemos estar completamente lá dentro. Isto começou a acontecer há pelo menos quatro ou cinco décadas. Não podemos fingir que é novo. Mas atingiu um ponto inaudito. Vejamos uma referência mais popular – os filmes: hoje em dia julga-se um filme pelos seus resultados de bilheteira. Se um filme for um sucesso de bilheteira, as pessoas nem se dão ao trabalho de falar do facto de ser ou não um bom filme. Talvez, mais tarde, numa coluna mais especializada [na imprensa], mas o grande título imediato é sempre: “Nº 1 nas bilheteiras”.

A pintura era uma arte de cavalete. Depois, tornou-se grande de mais para estar no cavalete. O que Pollock fez que ninguém tinha feito antes foi tornar a pintura não numa representação da paisagem mas em paisagem. E há uma certa ironia no facto de a tela passar a ser um território para ação [action painting] e de essa ser uma boa janela através da qual ver a relação entre a arte e o poder. Os terra tenentes não poderem definir a sua propriedade sem um sistema métrico. Também não se pode representar a paisagem de forma a que pareça real sem a perspetiva. Ora, a história da pintura é a história do desenvolvimento e da rejeição da perspetiva – porque o abstracionismo é a rejeição da perspetiva, a opção pela bidimensionalidade, sendo ainda, ironicamente, sobre território. Isto é especialmente irónico no caso do Pollock, porque ele pinta com a tela no chão. A tela dele é um espaço em que percorremos um território. E mesmo quando ele, no fim, volta a pôr a tela na vertical [na parede] toda a gente percebe que a forma como ali se chegou a um “significado” derivou da horizontalidade. Tal como a terra tenência está na base da acumulação de capital, estas pinturas também se tornaram num princípio de acumulação de capital. Na altura, ninguém estava a pensar sobre isto, mas eu não consigo deixar de pensar.

O modelo de transcendência proposto pelo expressionismo abstrato não poderia ter lugar no mundo e na economia do pós-guerra, porque os artistas dependem das ideias dos seus patronos. Por isso é que costumo falar no desenvolvimento dos públicos burgueses a partir de finais do século XIX e nas teorias que apontam o abstracionismo, o simbolismo e etc., como formas de fugir às questões do realismo, que levaria à representação das classes trabalhadoras e da militância do operariado. Claro que os artistas fizeram muito disso, mas principalmente no desenho e na gravura. E os que o fizeram não se viram muito bem pagos por isso pelos seus patronos, que, na verdade, queriam era ver outras imagens.

O modelo de transcendência corresponde ao facto de os artistas nos mostrarem outro mundo. Era uma teoria muito importante. Mas, no momento em que o [centro do] mundo da arte se muda [de Paris] para Nova Iorque [na década de 1940]… O patronato nos Estados Unidos nunca se interessou muito por especializações intelectuais ou teorias da representação, quer apenas coisas muito imediatas. Como Rockefeller disse um dia sobre [a pintura de Mark] Rothko – e vou parafrasear: oferece um espaço de relaxamento ao homem de negócios cansado. Isto é perfeito! O espaço da abstração é uma vista sobre outro mundo, sem quaisquer especificidades. Mas isto não podia durar, porque a arte passou a ser apreciada de forma massificada. Quando se tornou numa mercadoria, uma mercadoria cara, Jackson Pollock apareceu na capa da revista Life. A revista Life estava praticamente em todos os lares americanos! Estava nos consultórios médicos – estava em todo o lado. Definia a imagem do mundo. Antes de a televisão estar em casa de toda a gente, estava lá a Life. E, na capa, um dia, apareceu este artista que estava a destronar Picasso como o mais importante artista do século XX. Pollock acabou por morrer bêbado num acidente de carro muito pouco tempo depois e esta ideia de que a arte é suposto ser sobre outra coisa qualquer, misteriosa, transcendente… É um bocadinho doutrina católica, tudo isto. Não sei…


Os jovens artistas hoje vêem-se como produtores de mercadorias transacionáveis. Os que se projetam numa carreira de sucesso de cerca de 10 anos. É como os milionários.com: tinham uma ideia, que era comprada, reformavam-se e tinham uma vida feliz algures a não fazer nada que não quisessem. É o que pensam muitos jovens das escolas de elite, pelas quais pagaram muito dinheiro. Pensam: faço uma fortuna e desapareço durante a noite.

terça-feira, dezembro 02, 2014

Hiper-arte

A idade da inflação estética está descentrada, des-hierarquizada, estruturalmente eclética.
Estamos numa cultura fragmentada, balcanizada, onde se multiplicam as mestiçagens mais diversas, onde coabitam os estilos mais dissemelhantes, onde as tendências cool proliferam sem ordem, sem regularidade temporal, sem unidade de valor. Com o capitalismo transestético triunfa uma profusão caótica de estilos num imenso supermercado de tendências e looks, de modas e de design. É uma proliferação dissonante, desregulada, que caracteriza o domínio estético contemporâneo, paralelamente às desregulamentações económicas, constitutivas do turbo capitalismo.

Encontramos em todos os grandes museus do mundo as obras ou exposições dos mesmos artistas contemporâneos em voga.

Segundo a Organização Mundial de Turismo, tornou-se, com os seus 900 milhões de viajantes internacionais, a primeira indústria do mundo, representando cerca de 12% do PIB mundial. Nunca as exposições e os museus atingiram tais recordes de frequência, 8,8 milhões para o Louvre, 6,5 milhões para o Palácio de Versalhes, 3,6 milhões do Centro Pompidou, em 2011.

A dinâmica inflacionista não diz unicamente respeito aos objetos, estilos e tendências, mas também aos monumentos classificados (em França conta com 38.000 monumentos históricos e 300 aldeias pitorescas) e lugares de exposição de arte. Em primeiro lugar, os museus e os centros de arte contemporânea: em todo o mundo, o número de museus aumenta 10% de cinco em cinco anos, havia nos Estado Unidos, antes de 1920, 1200 museus e cerca de 8000 no início da década de 80. Diz-se por vezes, por graça, que se cria um museu por dia na Europa: mais de 30.000 museus estão hoje inventariados nos 27 países da União Europeia. Paris conta por si só com mais de 150 museus. O número de museus em França é objeto de debate: em 2003, a Direção de Museus de França declarava 1200 na categoria de “museus de França”, mas além desta categoria alguns guias publicam listas que vão dos 5000 aos 10.000 museus. Dificilmente se encontra uma comunidade que não queira ter o “seu” museu, como sinal de afirmação identitária e, o que não é menos importante, como centro de atração turística suscetível de gerar visitantes e, portanto, repercussões comerciais.

No decorrer da década de 80, o número de galerias de arte conheceu um grande aumento, tendo praticamente duplicado. Em 1988, o número de galerias elevou-se par 848. Muitas destas galerias tiveram uma duração muito breve, o que fez com que, sendo a sua taxa de mortalidade compensada por uma taxa de natalidade elevada, o seu número permaneça relativamente estável. A edição do guia Bill’art 2004 apresentava 590 galerias de arte moderna e contemporânea e estimava cerca de 6000 lugares “abertos ao público com a vocação de apresentar todas as formas de arte”. Galerias que, de facto, continuam a multiplicar-se ao mesmo tempo que o mercado da arte, saindo dos limites do Ocidente, se mundializa. Presentemente são milhares de galerias e de lugares de arte que apresentam em Xangai, São Paulo, Istambul, Abu Dhabi, milhares de exposições e dezenas de milhares de obras de artistas, eles próprios agora inúmeros.

Vaga que revela ainda a multiplicação de bienais, salões e feiras de arte internacional em todo o mundo. Depois da Documenta de Kassel e da Bienal de Veneza, contamos agora com mais de cem bienais, que apresentam centenas e milhares de artistas. Mais de 260 feiras são anualmente organizadas em todo o mundo. A Ásia participa já em pé de igualdade: a feira Art Stage Singapore reuniu em 2012, 140 galerias e o HK Art, de Hong-Kong, o dobro. Às quais se junta as feiras paralelas ou em “off”, que juntam galerias mais jovens, menos estabelecidas e que apresentam artistas menos conhecidos e mais baratos. Em Paris, em 2009,a FIAC apresentou 203 galerias de 210 países, e ainda mais 4 feiras off e 73 exposições. Em 2010, a Art Basel Miami recebeu 2000 artistas, 29 países e 250 galerias, enquanto uma multitude de feiras e de manifestações paralelas se desenrolava um pouco por todo o lado na cidade. Feiras que se organizam agora em rede, e que funcionam como multinacionais de arte: Art Basel, depois de Basileia investiu em Miami e Hong-Kong, e a feira inglesa Frieze estendeu-se a Nova Iorque. E o processo de expansão ampliou-se ainda com VIP Art Fair, a primeira feira de arte em linha que reuniu em 2011, durante uma semana, 130 galerias internacionais que apresentaram 7500 obras de 2000 artistas.


Com o capitalismo artístico, o pequeno mundo da arte à antiga deu lugar à híper-arte, superabundante, proliferante e globalizada, onde desaparecem as distinções entre arte, negócios e luxo. Aqui, a profusão (obras e manifestações) nada tem a ver com esbanjamento da “parte maldita”, cara a Georges Bataille; ela mostra a nova face do capitalismo artístico que, ao adaptar-se com eficácia à multiplicação planetária das grandes fortunas e de colecionadores, de investidores e outros especuladores, criou um sistema de comercialização e de difusão da arte à escala internacional.

Como escrever acerca da arte contemporânea


Orit Gat é uma escritora e editora colaboradora da Rhizome. Ela vive em Nova York, EUA. O artigo de Orit Gat na revista frieze, Edição 167, Novembro-Dezembro de 2014, acerca do novo livro de Gilda Williams sobre como escrever sobre arte contemporânea.

Vamos supor que há uma crise na escrita sobre arte. A última década viu uma série de ensaios, livros, painéis de discussão e eventos que debatem o estado da crítica, a morte do crítico e o desaparecimento das publicações de arte. Então, vamos imaginar que a crise: todas as análises simplesmente descrevem o que está em vista, em vez de dizer nada sobre isso; ensaios para catálogos nunca produzem novos conhecimentos, só servem para promover o valor de mercado de um artista; e a linguagem da imprensa é muitas vezes ridicularizada como oca. Todas essas mesas-redondas que trazem os críticos de volta dos mortos e ao pódio refletem uma crescente ansiedade sobre as possibilidades comunicativas da escrita.

Gilda Williams preocupa-se com todos os itens acima. Chamá-lo por qualquer nome – a sua ligeira depreciação “art-patois", mística" falar em línguas ", ou o simples velho “Artspeak” – é tudo de difícil compreensão para Williams. Ela propõe-se corrigir esse problema num novo livro, como escrever sobre Arte Contemporânea (publicado pela Thames & Hudson), que está estruturado para desembaraçar a confusão linguística que supostamente se estabeleceu. Em inúmeros pontos de vista, ela descreve o campo, seus jogadores-chave e suas inclinações particulares (citando, entre outras coisas, uma série de artigos frieze), e move-se então para discutir o estilo, o trabalho de lançar e as diferentes formas de escrita no contexto da arte contemporânea. A metodologia de Williams é impecável. Ela traz cerca de 50 exemplos de textos, que vão desde exposições comentários para trechos de ensaios para catálogos e declarações do artista, e analisa-os atentamente. Ela destaca o uso de verbos ativos, aponta substantivos específicos, desconstrói estruturas gramaticais complexas e, apesar de tudo, parece ler estas amostras mais de perto do que ninguém fez antes. Num estilo confiante – “menos discutir um certo tubarão flutuando em um tanque, ou aquele objeto de porcelana no banheiro assinado "R. Mutt", nunca assume o seu leitor lembrar-se ou viu a arte – Williams salienta que a abordagem essencial para escrever sobre arte deve ser para responder a três questões, facilmente resumidas: (1) O que é? (2) O que isso significa? e (3) Então, o que? Esta fórmula destina-se a responder ao que Williams vê como o paradoxo inerente a escrever sobre arte – “estabilizar a arte através de riscos de linguagem matando o que faz a arte valer a pena escrever sobre, em primeiro lugar ".

No mundo Williams descreve, o crítico da velha escola desapareceu, substituído por um "pau para toda obra", mas ela não se debruça sobre a origem deste desaparecimento – a realidade de escrever sobre arte, que é mal remunerada, essencialmente exercida por freelance e uma luta constante para manter uma ética em cheque – ou das suas consequências. Enquanto Williams reconhece que os escritores estão implicados de alguma forma na maior economia da arte, a conclusão que ela desenha é que "os críticos de hoje não são tão poderosos quanto foram [...] Ocupando quase a nível económico a base da pirâmide arte-indústria, os críticos são menos afetados por ciclos de expansão e contração. Quando as bolhas de arte estouram, arte-escritores muitas vezes têm mais para escrever sobre e nada de especial para se preocupar. Como Boris Groys afirma, já que ninguém lê ou investe em critica de arte de qualquer maneira, os seus autores podem-se sentir libertos para ser tão sincero como quiserem, por escrito, com poucas ou sem amarras. "Será que uma posição de poder escravizar um escritor? Não necessariamente. Na verdade, ela poderia dar ao crítico mais tração e apoiar a sua / seu papel como alguém que deve - e, potencialmente, poderia - manter o mercado em cheque. Quanto à avaliação do Groys que ninguém lê a crítica mais, à conclusão de que deve ser elaborada a partir dele é que o que precisamos urgentemente agora não é mais escrita, mas a escrita mais crítica.

Nenhum livro poderia ensinar um escritor a ser interessante, opinativo, envolvido ou apaixonado. E esse não é o presente objetivo. O seu objetivo é pegar numa disciplina que Williams concebe como altamente desregulamentada – e profissionaliza-la. Ao delinear exatamente como um catálogo do leilão difere da etiqueta da parede de um museu e de uma revista, até o vocabulário e tom que cada um deve acomodar, Williams dá uma visão para o funcionamento interno de muitos diferentes setores: academia, casas de leilão e imprensa profissional. Tendo em conta a ascensão de inúmeros programas académicos sobre a escrita de arte, um livro sobre o assunto poderia ser visto como uma entidade democratizante, mas a diferença entre um livro e uma escola é a interação. Mesmo que se recue na ideia de precisar de um mestrado em crítica de arte, a fim de escrever para uma revista  outro exemplo de um mundo da arte em que os termos de participação são um grau secundário, muitas vezes acompanhada de um deficit académico que poucos podem justificar financeiramente  pelo menos os programas permitem aos alunos um sentimento de comunidade. Quer se encontre num programa de pós-graduação ou não, é a participação no discurso e interesse em seus contemporâneos que faz de alguém um crítico. A técnica de Williams é casada com a obra de arte  deixa o trabalho guiar-te – que os riscos resultantes da escrita de arte estereotipada que negligencia o contexto intelectual a partir do qual a obra de arte emerge.

A escrita sobre arte não é uma indústria em crise – muito pelo contrário. As publicações de arte tornaram-se um reino complementar ao trabalho, não aquele que simplesmente descreve. A expansão física e conceitual do que a arte pode ser também produziu uma paisagem de publicação com um positivo tudo vai ethos, que devemos promover, ao invés de sufocar. Escrever sobre arte tornou-se um espaço em que os bons escritores podem discutir qualquer coisa, sublime ou mundano, da política às gravatas, tendências filosóficas para memes de internet. Enquanto Williams afirma que a escrita sobre arte precisa ser fundamentada em descrições da arte  o "o que está lá"  eu diria que este campo alargado de publicação é o que faz o material de leitura vibrante, se é ou não nunca menciona que esta ou aquela instalação de vídeo tem duas telas e um tempo total de 15 minutos. A escrita sobre arte deve ser acentuada e opinativa, mas também, por vezes frágil e errática. A escrita sobre arte não precisa ser mais profissionalizada  ela precisa ser concebida como um espaço para experimentar e expandir. Estas formas mais retrógradas da escrita criam um mundo da arte que é mais perceptivo, onde o que lemos é igual na sua ambição intelectual ao trabalho para o qual olhamos.